sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Efeitos da cultura McWorld



O século XX ficou conhecido como século do cinema, com o imperialismo das imagens em substituição à palavra impressa. O que se passa por "conhecimento" é comunicado à maioria das pessoas do mundo através do som e da imagem. Até os jornais procuram assumir formatos de TV. Olavo Bilac já previa: " Vem perto o dia em que soará para os escritores a hora do irreparável desastre e da derradeira desgraça.Nós, os rabiscadores de artigos e notícias, já sentimos que nos falta o solo debaixo dos pés...(...) O público tem pressa. A vida de hoje, vertiginosa e febril, não admite leituras demoradas, nem reflexões profundas." (Fotojornalismo, artigo publicado na Gazeta de Notícias em 13/01/1901) Em 1901!!!
Sobre o mesmo assunto, Benjamin Barber comenta que a abstração da linguagem é superada pela literalidade da imagem, trazendo sérios prejuízos ao homem: a imaginação se definha à medida que é menos solicitada; a comunidade vê enfraquecido seu elemento de coesão - a palavra; o bem comum é prejudicado porque depende das decisões coletivas de cidadãos conscientes, críticos, racionais, capazes de fazer uso da palavra impressa.
Essa questão está inserida em um contexto, ao qual Zygmunt Bauman denomina "modernidade líquida", onde se constitui uma espécie de "videologia", mais sutil que a ideologia tradicional, com o objetivo de seduzir, de insuflar valores que os mercados mundiais impõem. Um dos elementos dessa videologia é a MTV - Music Television Videos, a "alma barulhenta do McMundo", o maior shopping eletrônico do mundo, que existe exclusivamente como uma ferramenta de marketing da indústria fonográfica, fazendo desaparecer por completo a fronteira entre o entretenimento e a publicidade.
Mas o consumidor não nasce, é produzido. Para se exigir dos mercados uma verdadeira liberdade de escolha, os consumidores devem ter um bom nível de educação. Para isso, a escola pode usar a mídia como uma de suas ferramentas, desde que haja um esforço pedagógico claramente acertado, a fim de que a mídia incentive o aprendizado, a capacidade de crítica e não apenas o entretenimento. O consumo nos torna impulsivos e gananciosos. A educação desafia nossos impulsos e denuncia nossa ganância. No passado, esta obrigação era dos governos com responsabilidade de oferecer ensino público. Hoje, até o ensino público já virou mercadoria na cultura do McMundo!

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Marcas: idéias internalizadas


"O processo de habitar aquela idéia, de tornar-se aquela idéia, é um processo enormemente transformador e predatório, em especial para jovens e para a cultura jovem, porque a marca exige a absorção constante de tudo o que tem significado e é novo em nossa cultura."
(Naomi Klein - Marcas globais e poder corporativo)

"Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia tão
diverso de outros, tão mim mesmo
(...)
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente."


Eu, etiqueta

Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.

Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.

Carlos Drummond de Andrade

Fugindo da espetacularização



Criança é jogada da janela do sexto andar! Na novela das oito? Não, nos jornais. Madrasta tenta afogar o afilhado de dez anos! Nos jornais? Não, na novela das oito.
É a arte que se mistura com o real. É a vida como um “reality-show”. São os efeitos da banalização que transforma a vida em espetáculo.Foi o que aconteceu com o caso Isabella Nardoni, explorado exaustivamente pela mídia.
Porém, fugindo a essa tendência de espetacularização, surge um artigo publicado na Folha de São Paulo, em 10 de abril de 2008, pelo colunista Contardo Calligaris, no qual ele analisa o caso a partir de considerações a respeito da família “moderna”.

Comoção pela morte de Isabella

A tragédia nos lembra afetos dolorosos que regram nossa maneira "moderna" de casar

HOJE, QUARTA-FEIRA, quando acabo esta coluna, não conhecemos os eventos que levaram à morte de Isabella Nardoni; só sabemos que a menina, de cinco anos, foi assassinada, intencionalmente ou não, enquanto estava na custódia do pai e da madrasta. E conhecemos um pouco a história da família: a mãe e o pai de Isabella não chegaram a se juntar -foi um romance adolescente que acabou antes de Isabella nascer. O pai tem dois filhos pequenos com sua mulher atual.

É uma situação trivial: a pensão mensal, as visitas, o padrasto ou a madrasta, os meio-irmãos etc. Mas a banalidade dessa situação não deveria disfarçar o emaranhado de afetos dolorosos que ela produz -afetos que muitos vivem e que todos preferimos esquecer.

Não sei se esses afetos são responsáveis pela morte de Isabella. Mas talvez eles sejam responsáveis pela extraordinária comoção produzida pela sua morte. Como assim?

A morte violenta de uma criança nos fere a todos: é como se, ao mesmo tempo, alguém nos arrancasse um pedaço de nosso próprio futuro e destruísse a fantasia nostálgica da infância, que sempre cultivamos, mesmo que o primeiro período de nossa vida tenha sido infeliz.

Mas a história de Isabella nos comove também por outra razão: as tentativas de "explicar" o acontecido evocam, inevitavelmente, as dificuldades de nossa maneira "moderna" de casar.

São dificuldades nas quais, em geral, preferimos evitar de pensar.

É comum que o marido ou a mulher (às vezes, ambos) levem para o casamento filhos que são frutos de uma relação anterior. Espera-se que isso aconteça sem complicação: afinal, se descasamos e casamos por amor, por que o mesmo amor não reinaria pelo lar todo? Pois é, o amor é uma coisa complicada. Exemplos.

A rivalidade, que sempre existe entre irmãos, vinga entre enteados e meio-irmãos. E vinga redobrada, justamente por ser mais inconfessável do que a rivalidade entre irmãos -por ser silenciosa, reprimida pelo esforço geral de compor uma nova família ideal, em que todos os integrantes se amariam.

Na nova família, à primeira vista, o homem convive com seus enteados melhor do que a mulher. Não é nenhum milagre do "instinto" paterno: o homem encontra uma satisfação narcisista no exercício da paternidade. Ele, aliás, curte ser e se sentir amado por suas qualidades "paternas". Pare ele, saber ser pai de filhos e enteados faz parte de uma virilidade que ele quer que seja reconhecida e festejada pela mulher.

Mas cuidado: a encenação da paternidade, embora às vezes espalhafatosa, não resiste à pressão da culpa de dar para seus filhos de sangue menos do que para seus enteados.

Essa culpa, envergonhada e reprimida, é inevitável, porque há uma coisa que o homem, na grande maioria dos casos, dá mais aos enteados do que aos filhos: sua própria presença no lar.

A mulher, ao contrário, vive quase sempre uma rivalidade dramática com seus enteados: compete com eles como se ela fosse mais uma filha. Para a mulher, o enteado ou a enteada não usurpam o lugar dos filhos que ela trouxe de um casamento anterior, nem o lugar dos filhos que nasceram no novo casamento: eles ameaçam usurpar o próprio lugar dela. Essa rivalidade, escondida, expressa-se de maneiras travessas: por exemplo, numa crítica assídua das manifestações do afeto paterno do homem para com o filho ou a filha dele. Ou seja, para não admitir um ciúme envergonhado do enteado, a mulher censura o "excesso" dos sentimentos paternos do marido. Esse, criticado como pai, sente-se diminuído como homem. O desastre está às portas.

São apenas exemplos. O casamento "moderno" é um nó de afetos reprimidos, uma convivência explosiva que aposta no amor do casal como se fosse remédio para todos os males.

Não se trata de condenar a idéia de que seja possível refazer sua vida com outro ou outra e, nessa ocasião, levar consigo os filhos dos casamentos anteriores. Mas seria melhor que a gente se engajasse nesses projetos sem a ilusão de que os bons sentimentos prevalecerão por conta própria. Seria melhor, para começar, que nossas disposições menos nobres, em vez de silenciadas e reprimidas, fossem faladas, explicitadas. Isso, para evitar que, de vez em quando, a trágica morte de uma menina nos lembre, por um dia ou uma semana, que a vida das famílias "modernas" é muito mais difícil do que parece.

CONTARDO CALLIGARIS é psicanalista, doutor em psicologia clínica e colunista da Folha de São Paulo. Italiano, hoje vive e clinica entre Nova York e São Paulo.

sábado, 1 de novembro de 2008

O que é um bom jingle?

O que é um bom jingle? Bons jingles são aqueles que contribuem para eleger um candidato? E o que dizer sobre o “Ei, ei, ei Eimael”, que não sai da cabeça das pessoas e, no entanto, seu candidato nunca foi eleito? Não se pode medir cientificamente a eficácia de um jingle na complexidade da campanha eleitoral, porém, podemos afirmar que ele constitui uma poderosa ferramenta midiática, capaz sim de influenciar a opinião pública. Quanto à pergunta inicial, o publicitário Washington Olivetto nos responde: “jingle bom é aquele chiclete de ouvido”. Por outro lado, Hilton Acioli, autor do conhecido “Lula lá”, alerta: “música ruim também gruda e pode irritar o eleitor; aí fica uma coisa repetitiva, chata; as pessoas gravam, mas ficam com raiva”. É esse o assunto da reportagem da Folha Online, de 27/08/08, “Jingle pode tanto atrair como irritar eleitor”. Veja o vídeo.